Foquinhas da Patagónia

Quando Eu já repousava encostado à certeza que me conhecia o suficiente para me deixar descansado, eis que a minha mente se destapa durante o sono e deslinda um sonho que me deixa absolutamente descalço em cima das brasas da incredibilidade.

Assim, sem mais nem proximidades visuais com o que vou descrever, sai-me isto numa viagem nocturna ao inconsciente. Deliciem-se:

«Estou com a minha família num enorme parque zoológico norte-americano (sei que o é porque vi bandeiras, ouvi os anúncios das atracções em Inglês anasalado e disse-o aos meus filhos durante o dito sonho). É grande e cheio de gente, grandes lagos artificiais e rochas enormes de tons esbatidos, onde se penduram castelinhos tipo Disney World, envoltos nos respectivos fogos de artifícios multicores, que se deixam ver até na luz da tarde.

Entramos num dos túneis que permite observar um dos lagos artificiais por dentro, mas a seco. È bonito. Dá-nos um sorriso daqueles seguros numa ponta pela admiração e na outra pelo extasiamento aparvalhado. Tudo escuro, mas não preto. Azul. Azulão, de tom forte. Quase luz negra, mas em azul forte. Esta visão aparece-me num ecrã 16:9, tipo plasma. Para onde quer que olhe, é só aquele formato que o meu olhar desenha: uma janela 16:9 de fundo azulão.

Lá vou Eu, com os meus filhos pela mão, quando atravessa a tela do olhar uma pequenina foca – não mais de um palmo – preta às bolinhas brancas, que acena com uma barbataninha e sorri, com aquela cara simpática que só as focas de um palmo têm. Desliza num movimento arrastado e rectilíneo, como se de um jogo de vídeo dos anos oitenta tivesse sido libertada.

“Olhem, meninos, é uma foquinha da Patagónia” Digo Eu deliciado, numa voz de fundo do mar “E outra. E outra”. As foquinhas da Patagónia, nunca mais de três, cruzam-se em trajectórias oblíquas, que começam e terminam em cada um dos limites daquela janela que se mantém rígida e inflexível. Os miúdos gostam e retribuem o aceno aos pequenos e simpáticos bichinhos pintalgados, que continuam a sorrir (como não poderia deixar de ser).

De repente, no mesmo movimento lento e contínuo, mas horizontal – da direita para a esquerda - surge uma desproporcional morsa com uma pele borbulhenta e rugosa (de fazer inveja a um sapo de 743 anos) riscada de verse marinho e lilás, e aproxima-se de uma das foquinhas da Patagónia, comendo-a, não parando esta de sorrir e de acenar enquanto é devorada. Não há sangue, mas a visão angustia-me.

A morsa desaparece na parede do lado esquerdo, e volta a surgir do mesmo sítio, voltando a repetir-se a cena, mas com outra foquinha da Patagónia, que descia num rumo desviado. Ficamos todos especados a olhar. “Está a comer as foquinhas da Patagónia” aponta a minha filha para a brutal morsa. Não digo nada. Já só vejo uma foquinha da Patagónia, que continua na sua simpatia repetitiva. Já só ela se mexe de um lado para o outro, a morsa desapareceu.

E quando o azulão só era interrompido por aquela solitária foquinha da Patagónia, surge do lado esquerdo um tubarão de peluche, rosa-choque, com uns olhos branco globulares, externos ao corpo, e uma boca sorridente onde estão riscados enormes dentes brancos. Todos olhamos para este novo “animal”. Sem mexer qualquer parte componente, o bicho de pelúcia dirige-se para o lado direito e... come a última foquinha da Patagónia, que nadou direitinha à sua bocarra fechada com aqueles dentões brancos.» Fim do sonho. Acordei, não sobressaltado, mas acordei...
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Nota1: o que mais me impressiona – sim, sou impressionável - é o facto de isto se ter passado no início da semana passada e ainda estar bem desenhadinho na minha memória

Nota2: Esta é a versão curta do texto – a versão de coleccionador contém as minhas interpretações – caso queiram adquirir a versão completa dirijam-se a um quiosque que venda o jornal “O crime” na sua edição de Abril, ou arranquem uma pestana, formulem esse desejo com muita força e ponham o dito filamento piloso para dentro da camisola.

3 Comments:

Blogger [A] contribuiu com estas palavras sábias:

o menino é lindo....mas o vinho!!!
(dito de um antepassado num baptizado)

julho 25, 2006 8:12 da tarde  
Blogger [A] contribuiu com estas palavras sábias:

mas isto cheira-me a grande metáfora...
quem serão as foquinhas, a morsa e o tubarão rosa-choque???

E na Patagónia há isso tudo??? julgava que só havia pistoleiros e pinguins...

julho 26, 2006 12:07 da manhã  
Blogger Inha contribuiu com estas palavras sábias:

Bem vindo à terra do tio sam! Realize os seus sonhos! Aqui tudo é possível!:D)))Até as focas acenam enquanto estão a ser comidas!...;)

Porquê nos estados unidos? Dali não pode sair boa coisa mesmo. Tenta a Nova Zelândia ou a Dinamarca...;)

julho 26, 2006 1:49 da tarde  

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